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The Cat Run

Uma cena sobre corrida em geral e running em particular e também sobre a vida que passa a correr. Aqui corre-se. Aqui só não se escreve a correr. Este não era um blog sobre gatos. A culpa é da Alice.

The Cat Run

Uma cena sobre corrida em geral e running em particular e também sobre a vida que passa a correr. Aqui corre-se. Aqui só não se escreve a correr. Este não era um blog sobre gatos. A culpa é da Alice.

16.05.15

ERA UMA VEZ NA AMÉRICA ( FREEDOM )


The Cat Runner

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(Foto by The Cat)

 

Liberdade.

É sobre a liberdade, a amizade e a felicidade que este texto trata.

Desde que cheguei a Newport, nos Estados Unidos, tenho corrido todos os dias, sem excepção. Este domingo partimos para casa. Será a última corrida mas, a corrida deste sábado foi uma das mais curtas e fantásticas da minha vida.

Este domingo eu era para ter corrido a meia maratona do Douro Vinhateiro. Tinha convite e hotel marcado.

Vim para a América. Valeu a pena. Para o ano não falho, jurei a mim mesmo.

Por cá, pelas américas, pela manhã, como sempre - aqui acordo às sete da manhã -  saí para correr pelos meus amigos com quem não corri no Douro, amigos que conheço do facebook e que ia conhecer pessoalmente durante a corrida.

Corri por mim e corri com um amigo novo, o Zé Pedro Amaral.

Ele tem-se revelado um profissional de primeira linha e um ser humano fantástico.

É o director do Stop Over de Lisboa da Volvo Ocean Race.

Podia ser um daqueles narizes empinados. Não. É como eu. Como tu que me estás a ler.

Saímos juntos.

E tudo começou ao primeiro quilómetro.

Pela primeira vez não corri com os phones. O Zé Pedro não levou o iPhone. Corremos com a música em alta voz.

Lá ao fundo aproximava-se uma rapariga fluorescente.

"Good morning", disse ela à nossa passagem.

Sorrimos. 

"Isto é a corrida, já viste? Não a conhecemos de lado nenhum mas ela fez questão de nos cumprimentar!"

O Zé Pedro não corria há três meses por causa de uma lesão. Regressou ao alcatrão comigo.

Eu não gostava de correr acompanhado. Estou a apreciar correr com companhia, cada vez mais.

Por isso fomos ao ritmo dele, por isso lhe perguntei, a brincar, se queria sentar-se no sofá que está na foto na parte de cima deste texto.

Não nos sentámos.

A palavra Liberdade já lá estava.

Foi isso que sentimos nesta manhã americana, a sensação de total liberdade.

A minha mãe, sem saber, tem uma avenida em Newport, com o nome dela.

Bateu-me no coração.

Só saí de casa há quatro dias. Parece uma eternidade.

Estou com muitas saudades dos meus.

Como estou quase a voltar para os sorrisos deles senti aquela coisa de estar quase quase a chegar à Terra Prometida.

Não, não é a América a Terra Prometida.

É a minha gente, o meu ar, o meu sol, o meu lar, a minha família, os meus amigos, é aí em Portugal que está a minha Terra Prometida, qual Shangri-La.

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(Foto by Zé Pedro Amaral) 

 

Shangri-la é descrito como um lugar paradisíaco situado nos Himalaias, onde existem lugares maravilhosos e onde o tempo parece deter-se em ambiente de felicidade, com a convivência harmoniosa entre pessoas das mais diversas procedências.

Shangri-la sente-se.

É a promessa de um mundo novo possível, no qual alguns escolhem morar, ou um lugar assustador e opressivo, do qual outros resolvem fugir.

Decidimos fugir da placa. Corremos.

- "Zé Pedro, olha ali..."

Um esquilo gigante com uma bolota na boca a subir uma árvore milenar.

Não consegui tirar o retrato. O sacana do esquilo foi mais rápido que eu.

Ficou o registo na nossa memória, certo, Zé Pedro?

Este sábado fomos à descoberta da América. Desta onde estamos.

Por momentos corremos no bairro da série Weed, depois junto ás casas das Donas de Casa Desesperadas e, finalmente, na série The Wood.

Hoje corremos dentro das séries norte-americanas. As ruas, as casas, as pessoas.

Uma placa manuscrita dizia sell yard.

- "Zé Pedro, os gajos estão a vender o pátio?"

Não estavam. Estavam a fazer vendas de garagem. É assim aos sábados, nesta América onde estou.

Good morning, disseram-nos, pela segunda vez em três quilómetros.

Voltámos a parar numa rua, para tirar uma foto.

O Zé Pedro e a placa Boulevard. Ele ficou com a foto só para ele. Não a coloco aqui. É dele.

Boulevard é a empresa dele.

 

O tempo corre connosco.

Agora é tempo dos barcos fantásticos irem com ele para Lisboa e nós também.

Vamos regressar a casa, mas levo a América, esta América no coração.

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(Foto by The Cat) 

 

Nos outros lados não sei, aqui as pessoas são simpáticas.

Ainda na sexta, porque o táxi não chegava, foi o namorado da recepcionista do hotel quem nos deu boleia para o jantar de gala.

Seis dentro do carro, sem stress, e ainda se ofereceu para nos ir buscar à noite para nos levar de volta ao hotel. Agradecemos e recusámos. Não se deve abusar da gente boa desta vida. São tão poucos.

Aqui, os carros devem ter um qualquer trauma que, mal vêem um peão na rua a tentar atravessar a estrada, desviam-se uns mil e duzentos quilómetros. No mínimo.

Os autocarros antigos chegam a parar para lhes tirarmos fotos.

Na Race Village da Volvo Ocean Race somos tratados nas palmas das mãos.

Por isso fiquei a amar esta América e levo-a comigo.

Lá seguimos, eu e ele, ao ritmo dele e das histórias que fomos recordando, à medida que víamos as casas, os jardins, as placas com os nomes das ruas, as pessoas.

- "Zé Pedro, o nosso hotel é lá ao fundo, falta um quilómetro para os cinco, estás bem?"

Respondeu que sim.

Chegámos ao hotel. Fizemos os alongamentos, que as pernas são tramadas.

A Ana Colaço e o Carlos Rodrigues já estavam à nossa espera.

O Rodrigo Moreira Rato (eu diría que ele é mais ave madrugadora do que rato) há muito que tinha ido para a Race Village.

Chegámos, fomos ao meu quarto, dei uma bebida energética ao Zé Pedro, que tinha comprado uma hora antes, na bomba da gasolina.

Até uma raspadinha americana comprei. Não me saiu nada.

Tomámos duche, cada qual no seu quarto, obviamente (pode rir).

Chamou-se o táxi. 

Esperámos cá fora.

- "Esta noite começou a ouvir-se aquele barulho de ontem", disse-lhes eu.

- "Pois foi, mas parou logo".

- "Fogo, ainda bem".

Desta vez rimos nós.

Levo muito desta viagem.

Mas, levo duas palavras comigo, liberdade e amizade.

Fico feliz quando sinto que faço um amigo. Acho que fiz um, na América. Um não, dois, porque a Ana também é minha amiga.

Só quem corre tem sorrisos amigos iguais a estes dois.

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(Foto by The Cat & Zé Pedro Amaral - a chamada selfie)

 

Escrevo este texto na sala de imprensa da Volvo Ocean Race.

Tenho que me despachar. Falta colocar as fotos, formatar o texto e publicar.

Daqui a um quarto de hora faço-me ao mar.

Vamos ver a regata.

Hoje vamos só ver, também temos direito (pode rir de novo), não é só trabalhar, trabalhar, trabalhar.

Portanto, vou acabar, se não, devido à deferença horária, quando publicar o texto já é domingo e assim não cumpro a promessa de uma corrida/um texto todos os dias.

Não me leve a mal. Eu também gosto muito de escrever para si, mas tem que ser.

Eu sei que não leva a mal.

Prometo tirar uma foto da regata para lhe oferecer e pedir um autógrafo à Caroline, a holandesa da equipa sueca que fala perfeitamente português.

Foi o meu amigo do facebook, Carlos Oliveira, que vive em Inglaterra que me pediu.

Aos amigos eu nunca digo não.

Hoje corri na terra da liberdade.

Aqui, nesta América não é a Terra Prometida. É a terra da minha liberadade.