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The Cat Run

Uma cena sobre corrida em geral e running em particular e também sobre a vida que passa a correr. Aqui corre-se. Aqui só não se escreve a correr. Este não era um blog sobre gatos. A culpa é da Alice.

The Cat Run

Uma cena sobre corrida em geral e running em particular e também sobre a vida que passa a correr. Aqui corre-se. Aqui só não se escreve a correr. Este não era um blog sobre gatos. A culpa é da Alice.

07.03.24

POKER FACE


The Cat Runner

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Estão todos sentados à volta da mesa. Oval.

Lugares espaçados o suficiente para os olhares nada alcançarem.

São muitos.

Estão todos lá, sentados, a jogar o jogo que mais adora, aquele que é o mais perigoso de todos os jogos.

O baralho cheio de cartas da vida nas mãos de quem joga o jogo.

Poker Faces.

Estão todos a jogar.

Carta-a-carta, após olhar-a-olhar, saltam, as cartas, para a mesa, à vez.

Há sorrisos, há formigueiro, mãos que transpiram, estômagos que se encolhem, sentem a pressão nas artérias, a cabeça estala e as têmporas parecem querem correr cem metros porque não há Poker Face na cartada final.

Todos o sabem.

No final, todos deixam escapar algo que não era suposto.

Todos o sabem.

Inebriados pela adrenalina do jogo esquecem-se.

Um jogador não esquece. Estão na mão.

É nessa altura que o mais exuberante da mesa, aquele que julgavam fazer bluff, olha para as suas últimas duas cartas.

Já não há leitura de jogo possível porque o momento transformou-se nma decisão, num lance, numa cartada, uma acção.

Isso era lá atrás, pensar o jogo.

Duas cartas, até que fique a última. A mão. A decisão. O tudo e o nada. Ou o tudo ou o nada.

Curioso, todos os que jogam o jogo olham agora como autómatos, apenas rodam o pescoço, lentamente, para um lado, para o outro, como que a pensar, caraças, quem é que tem o às de trunfo.

Só que a vista não alcança. Sentem-se perdidos, eles que antes se sentiam os donos do jogo.

É o jogo.

É ele que vai decidir esse jogo que todos adoram jogar.

A penúltima carta tem que ser lançada, para cima das outras, para a mesa, mas tem que ser o move mais bem pensado de todos.

Só para enganar.

No último lance de mão só um dos jogadores terá o às de trunfo.

É a lógica.

E, é nesse momento que tanta coisa se decide.

Incrível, uma decisão de tudo-ou-de-quase-nada depois de tanto.

Parece aquela história que diz que subimos a montanha, dura, com dificuldade e provação, para chegar ao topo e ver o mundo inteiro à volta. É verdade, diz que já lá chegou.

Olha-se, uns aos outros, enquanto um deles olha-os a todos, sem que saibam.

Não conhecem outra cara, só a Poker Face, pelo que lhe é fácil controlar o jogo.

São segundos, que aquilo não dura sempre, nada dura sempre, nem o amor, sequer, nem a vida, veja só. Tudo a mil. Até o cérebro, sobretudo ele.

Atira a carta para cima da mesa. Atiram todos, acto contínuo.

Só os mais incautos ficam espantados quando à volta da mesa, oval, todos os jogadores lançaram o seu às de trunfo.

Incautos!

Ganharam todos?

Nunca ganham todos, uns aprendem, mas outros perdem, verdadeiramente.

Paz às suas alminhas, que deus os tenha e guarde.

São segundos que medeiam o lançar da carta, que mostram um filme inteiro, o do jogo, até então, e que implodem, quando todas as cartas estão na mesa. Acabam, como o tempo que também se esgota só que é intemporal, o tempo.

O jogo limita-se a acabar no tempo.

É então que os mais fortes ganham, os mais inteligentes aprendem e os mais fracos se auto-consomem nas chamas do inferno.

No inferno não que diz que aquilo é top.

Consumam-se uns aos outros, fora do inferno, para não ocupar espaço,  ou arranjem lá maneira de sair deste texto, se faz favor.

Tudo ok, agora?

Óptimo.

Alguns esfregam as mãos quando do nada que a mesa é virada ao contrário, o jogo muda.

Muda tudo.

Pensavam que tinha terminado mas as cartas estão espalhadas pelo chão.

Estão todos de pé. Atónitos.

Olham-o de alto a baixo.

Desde os mocassins em pele, às calças vincadas, justas, azul-bebé, miram-lhe o cinto em pele, passando pela camisa slim fit azul escura, detendo-se no rosto escuro, contornado por uma barba alinhada como que a apresentar um cabelo desgrenhado.

Que é este, afinal, perguntam-se sem verbalizar uma única palavra, sem emitirem um único som?

Apenas pensam só que nunca saberão.

Um jogador que não faz Poker Face esconde sempre algo também, mas esconde bem escondido.

Nem trejeitos, nem tiques, nem olhares, nem palavras, nem gestos, nada o desmascara.

Ou se tudo o desmascara é porque ele joga bem à vida.

É simples, Poker Face is fake.

Ponto.

É uma máscara, por isso não consegue emanar o poder da genuinidade.

Apenas tenta enganar.

Enganar is chip.

Manipular é arte.

Tal como jogar.

Na verdade o “segredo” está em saber sempre que todos à volta da mesa, oval, têm o seu às de trunfo e sentir qual é o momento certo para virar o jogo, virando a mesa ao contrário.

Se é segredo, segredo será.

Nunca se mostra o jogo todo.

Quem pensa que vê o jogo inteiro é incauto.

Lá está, descansem em paz, que no Inferno, aquilo, viram mesas todos os dias.

Querem lá saber de ases de trunfo.

Como diziam antes de Cristo: let the games begin

(não sei se diziam em inglês, naquela altura).

Kiss on the shoulder and take the sunglasses off. 

No more Poker Face in the house.

It´s time for “one shot”.

Go get them boy…