ALICE DE FOLGA
Dia 27
27/10/2016
Coisas de gajos...
Consegui passar um dia com Alice.
Ela não se apercebeu, mas observei-a o tempo todo.
As suas reacções, os seus gestos, os seus passos.
Alice andou pelo mundo fora.
Acordou, de manhã, quando entrei na cozinha para tomar o pequeno-almoço.
Levou algum tempo a sair da cama, tal como eu, mas ainda não tinha tirado o café já Alice me atacava os pés.
Voltámos para a cama. Para a minha cama.
Alice andou a conhecer o território por onde agora se passeava, e depois foi atacar-me na minha própria cama.
Os ataques continuaram, sempre que possível, ao almoço, na sala, por isso me atrasa os textos – Alice insiste em passear pelo teclado, até que lhe dei assim uma ordem com tom mais forte e desapareceu -, aposto que está onde costuma estar quando desaparece, na cama, dela.
É esta a conclusão a que chego.
Há parecenças entre Alice e eu.
Ambos adoramos estar na cama e dormir.
Foi o primeiro dia de folga que passamos juntos. Observei-a. Percebi que, mesmo quando a Cristina a vem visitar e passar umas horas com ela, ou quando está sózinha, neste caso comigo, Alice dorme que se farta.
Não admira que à noite tenha as baterias tão recarregadas que às vezes chateia, no bom sentido. Tal como eu.
Este dia passado com Alice foi tão divertido, e acompanhado, que até deu para treinar Muay Thai.
Ela com as patas e com o focinho e a boca, os dentes parecem agulhas fininhas, eu com os dedos.
Ela dava-me um low kick e eu respondia com um circular na cabeça, começou a ficar em sentido. Menos mordidelas.
Sempre que me atacava com uma pata o meu dedo respondia com um joelho no focinho, sem a magoar, claro.
Às tantas comecei a emitir sons sempre que disparava um golpe.
Compassados. Ué...ué...sempre que lhe aplicava um golpe.
Aí, começou a tentar perceber o que estava a acontecer.
Tornou-se mais lenta a atacar.
Apostei no clinch e enrolei os dois dedos aao seu pescoço. Defendei-se com as patas. Afastei-a. Circular médio.
Limitava-se a defender, encostada às cordas.
Terminou ali a luta.
A cauda andava à roda e sempre que a cauda anda à roda as prioridades de Alice mudam.
Que alívio.
Consegui passar um dia com Alice.
Estou de folga até segunda feira, Alice está de folga quando quer. Acertámos agendas e o dia foi nosso.
Consegui perceber o que faz Alice quando está sem companhia.
Brinca e rebola-se quando o sol entra pela cozinha, corre por onde pode, come, bebe, participa em lutas imaginárias, no fim dorme.
Pela primeira vez, depois de adormecer no colo de Maria e de Carla, adormeceu no meu colo.
É por causa dessas lutas imaginárias que o próximo texto terá um ponto de interrogação no final.
É que gostava de saber se Alice pensa. Em que pensa, quando anda por aí, por aqui, junto de nós.
Hei-de saber.
Por agora, sei apenas como ela passa os seus dias de folga.
Dorme muito, como eu.