ALICE JORNALIS(T)A
Dia 29
29/10/2016
Sobre coisas tecnológicas...
Alice ficou de castigo, pela primeira vez na vida.
Alice devia ter falado, conversado comigo, e eu ter-lhe-ia explicado como e onde podia ir ter umas luzes de jornalismo.
Não o fez, foi castigada.
Vamos aos factos:
Alice estragou-me a tecla “T” do teclado do macbook.
Nos últimos dias tenho-a avisado; não anda em cima do teclado.
Quer ler, escrever, relatar, noticiar, conversemos, não é assim.
Já deu para perceber que Alice tem total liberdade par andar pela casa, há uns dias a esta parte.
Tem-se portado bem.
Mas, hoje, ficou de castigo.
Ainda que tenha durado pouco tempo.
Alice salta para cima do sofá, vinda do nada.
Dá um toque no computador, volta para o chão.
Não se entende com o computador, apesar dos meus apelos; Alice vai para junto da dona, ela tem o tablet, também é giro (acredite, não faz ideia da força que tenho que fazer na tecla, sempre que preciso de escrever um “T”, e já o fiz 23 vezes, ao longo do texto, para além de quanto isto me vai custar a arranjar) .
Alice estava em cima das costas do sofá, sentada, a olhar fixamente para o que eu estava a escrever, ou, provavelmente, em posição, a aguardar o momento de saltar, por causa dos movimentos dos meus dedos.
Acredito na primeira hipótese, estaria a ler o que escrevo. A aprender.
A vida de Alice tem sido uma aprendizagem, como a minha, como a vida de quem vive.
Em vez de perguntar, não, atirou-se de rompante para o sofá.
Saltou para cima do teclado. Irritou-me, porque não gosto, detesto que me interrompam, enquanto escrevo.
Peguei em Alice com a mão direita, levantei-a, coloquei-a no chão e em voz alta disse: Alice, no computador não, fica no chão.
Alice insistiu.
Pensei, como em outras vezes, que acabaria por descansar e parar.
Mau mesmo foi quando coloquei, de novo, os olhos no teclado.
A letra “T” estava esventrada.
O teclado avariado, sem o “T” em condições, o que me obriga a carregar na tecla com mais força e, por simpatia, carrego em todas as outras que estão boas, com igual força.
Meti Alice no chão, ordenei com voz firma que fosse para a cozinha, ela foi, fechei a porta.
Coloquei os phones e continuei, irritado, confesso, a escrever o texto.
“Estás a ouvir a Alice a miar?”:
Tirei os phones, Alice estava a miar, pela primeira vez usava o som para comunicar.
Alice miou pela primeira vez como uma gata deve miar.
Provavelmente, magoada, triste, mal habituada, habituada a estar junto de nós todas as noites, ao ponto de adormecer envolta numa quente ternura, e ainda nem acendemos a lareira da sala.
Coloquei os phones, continuei a escrever.
Tenho a tecla “T” avariada, esventrada, porque quando peguei em Alice, para a tirar de cima do teclado a unha ficou presa na tecla “T” e levantou-a.
Nem quero pensar quanto me vai custar arranjar isto.
Todos os meses tenho “extras” para pagar, ou é o IMI; ou a revisão, ou os dois, ou o teclado do macbook.
Já abri a porta da cozinha.
Não lhe resisti ao miar. Nunca a tinha ouvido a falar connosco, como que a pedir: abram-me a porta, que eu porto.me be.".
Não lhe resisto nunca. Não ia ser desta vez.
Alice está agora a brincar com os phones.
Não tem problema, custaram 2 euros e 50, no chinês.
Amanhã passo lá, a ver se eles têm a tecla “T” para o macbook e compro outros phones, se calhar cor-de-rosa.
Não quero ser o responsável por Alice se desviar do seu sonho.
Ela quer ser jornalista.
E um(a) jornalista sem "T" não passa de uma jornalisa.
Com ou sem teclado.