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The Cat Run

Uma cena sobre corrida em geral e running em particular e também sobre a vida que passa a correr. Aqui corre-se. Aqui só não se escreve a correr. Este não era um blog sobre gatos. A culpa é da Alice.

The Cat Run

Uma cena sobre corrida em geral e running em particular e também sobre a vida que passa a correr. Aqui corre-se. Aqui só não se escreve a correr. Este não era um blog sobre gatos. A culpa é da Alice.

01.11.14

PÃO POR DEUS PORQUE AS BRUXAS TAMBÉM CORREM À NOITE


The Cat Runner

bruxas


 


 


Eu lá ia deixar de correr hoje. Logo hoje! Esta noite!


Foi uma decisão inconsciente, correr à noite na noite do "pão por Deus", perdão, das bruxas.


Inconscientemente imposta, a decisão. Detesto imposições. Não é assim que funciona. Gosto das coisas pré-determinadas, não gosto de coisas pré-concebidas, sobretudo ideias e posicionamentos.


No dia em que se votou a proposta de Orçamento do Estado, no dia das bruxas, a agenda foi mais austera que o próprio Parlamento.


A reunião da manhã foi adiada, mas logo foi marcada uma outra - bem agradável, por acaso, um mini brainstorm. Adoro brainstorms, a sério.


Já não consegui ir à Fisiogaspar visitar o meu amigo António e perceber como é que vou corrigir, digamos, uma descompensação estrutural, no lado esquerdo, em particular na perna e pé esquerdos, provocada por um grave acidente em 2004.


Agora, vai dar-me jeito arranjar isto.


Segui para a tv.


Apanhado por uma manifestação, mais uma.


Alguém já contabilizou este ano?


Uma hora no Marquês de Pombal, meu caro ou minha cara, nem quando o Benfica é campeão eu vou ao Marquês de Pombal.


Apenas queria ira da reunião- na segunda-feira bloquearam-me o carro no mesmo sítio de hoje - para a tv.


Não contando com os aviões militares russos que agora não nos largam a barguilha - vai-se a ver e é por causa do jogo do Sporting -, não contando que andam bruxas à solta em São Bento, não contando com o criminoso que confessou o crime e o inocente que está preso - é este o meu trabalho, dar notícias às pessoas, mas também dou boas notícias- a agenda não me deixava alternativa; só podia correr à noite, depois de uma tentativa frustrada de passar na Fisiogaspar, em alternativa ir comprar uns ténis novos para estrear ao quilómetro dois mil, frustrada, a alternativa, pensei no que acabei de escrever: no meu trabalho.


Dar notícias às pessoas. Más e boas. A Telma Monteiro ganhou, o Benfica ganhou, o Ronaldo vai ganhar e o Platini e o Blatter vão perder, dar notícias.


Logo eu, tímido. Sou. Obviamente que sou.


Dar notícias às pessoas não é tarefa fácil.


As boas, bom as boas todos gostam de as dar.


As más...


Ultimamente só tenho dado más notícias às pessoas. Ultimamente só me tem dado más notícias. Eu sei porquê!


Se recuar uns textos na máquina de escrever, alguns textos, está lá: na passagem de ano ninguém comeu as doze passas. Foi maldição.


Quem tem o mesmo ofício que eu sabe o que agora vou dizer.


Na maioria das vezes, depois de acabar de trabalhar, quando estou a dar notícias às pessoas, carrego nos ombros o mundo quase inteiro. A dor e os dramas dos outros. Há tragédias. Nós damos notícias trágicas às pessoas. Não são virtuais. Nada é virtual, a não ser o cenário do estúdio.


Às vezes as pessoas contam as histórias do lado de lá do ecrã, no momento exacto, chamamos-lhe directo. Mas, somos nós quem está a dar a notícia às pessoas. E nós, somos pessoas?


Pelo menos eu carregou o mundo quase inteiro nos ombros, quando saio do trabalho e vou para um lado qualquer. Nunca tenho destino certo.


Correr dá-me aquilo que preciso para me manter emocionalmente equilibrado, para dar montanhas de más notícias às pessoas. É um facto que só as vêem por opção, mas haverá a opção de fechar os olhos?


É que depois, cá fora, também eu, também nós temos uma vida.


E já nos basta ter que a levar a correr.


Bruxas para quê?!


As bruxas já não são horríveis, elas são bruxas belas.


Os homens é que aprovam orçamentos de vida austeros.


A noite é das bruxas. O dia também.


Vi algumas, esta noite, enquanto corria.


Esta noite levei-me pelas ruas da cidade, pelo fresco, pelo meio de bruxas mal amanhadas, caras pintadas, chapéus a furar o céu.


Hoje vi gente que a coisa mais doida que terá feito na vida foi tirar selfies disfarçada de bruxa, versão século pimba.


Que sejam felizes. Eu acho que cada qual deve correr atrás da sua própria felicidade. Correr, apenas e ser feliz.


Fui correr à noite para ver as bruxas.


As verdadeiras.


Durante o dia também vi algumas.


Só tinham elásticos na cara.


Dispensam máscaras.


As bruxas que vi esta noite não tinham vassouras voadoras.


No fundo, era isto que eu queria dizer!


Alguma vez eu ia deixar passar esta oportunidade de escrever na noite das bruxas. Alguma vez eu ia deixar passar esta oportunidade de correr na noite das bruxas.


Hoje já é um de novembro.


Hoje já é dia de "pão por Deus". Faltam 60 dias para acabar o ano e 83 quilómetros para chegar aos 2 mil.


Hoje já é "Dia de Todos os Santos" e amanhã o São Gabriel tem 13 quilómetros para correr, depois de dar notícias às pessoas.


Uma bruxaria!


( Ah e evitei aquele chavão de que não há bruxas mas que há e não sei mais quê ao longo de todo o texto, o que revela alguma capacidade para fugir das bruxas)